Descubra o KÍ Klaksvík: Time das Ilhas Faroe com toque ‘brasileiro’, histórias de superação e busca por vaga na Europa League

Com uma área um pouco superior a 72 km² e cerca de 5 mil moradores, rodeados por um pequeno arquipélago situado no norte do Oceano Atlântico, a cidade de Klaksvík, nas Ilhas Faroe, está ganhando destaque no cenário futebolístico europeu desta temporada. A partir do próximo mês, o modesto KÍ Klaksvík, um dos maiores clubes do território, que embora não seja considerado um país, competirá na fase de grupos de um torneio da UEFA, marcando um feito inédito.

Fundado em 1904, o Klaksvíkar Ítróttarfelag, conhecido popularmente como KÍ, é um dos principais times das Ilhas Faroe, um arquipélago que pertence à Dinamarca. Com 20 títulos nacionais e seis Copas conquistadas ao longo de seus 119 anos de existência, o clube tem suas raízes profundamente ligadas à cidade de Klaksvík, situada ao norte do arquipélago, conhecida por seu significativo centro pesqueiro, que contribui para a fama dessa localidade entre os aproximadamente 5 mil habitantes.

Na virada do século 20, a região se transformou em um importante polo cultural e comercial, tornando-se o segundo mais vital no arquipélago, exatamente quando o KÍ foi fundado. Desde sua temporada inaugural em 1942, o time ganhou o título do Campeonato das Ilhas Faroe e buscou preservar sua essência fundacional: um local de convívio, prática esportiva e serviço à comunidade.

A trajetória da equipe nas fases eliminatórias das competições europeias é uma raridade. Embora não seja um país independente, as Ilhas Faroe têm suas próprias federações e seleções reconhecidas pela FIFA e UEFA, competindo em torneios internacionais. O KÍ, campeão do campeonato nacional em 2022, assegurou sua participação nas fases preliminares da Liga dos Campeões, superando o húngaro Ferencvaros e o Hacken, da Suécia, durante o processo de qualificação. No entanto, na terceira fase, o time foi derrotado pelo Molde, da Suécia, depois de vencer uma partida, e foi “rebaixado” para a Europa League.

KÍ Klaksvik foi eliminado da Champions League na terceira fase, contra o Molde. Foto: Svein Ove Ekornesvåg/AFP

Nesta quinta-feira, a equipe busca alcançar uma classificação histórica para a Europa League, enfrentando o Sheriff após um empate por 1 a 1 nas Ilhas Faroe. A equipe da Moldávia competiu na fase de grupos da Liga dos Campeões na temporada 2021/2022 e, assim como o KÍ, foi o primeiro time do país a alcançar essa etapa da competição. Caso seja eliminado, o time das Ilhas Faroe disputará a Conference League.

No âmbito nacional, o KÍ é o segundo clube que mais vezes conquistou o campeonato nacional, ficando atrás apenas do Havnar Bóltfelag. Mesmo assim, o clube passou por um período de 20 anos, entre 1999 e 2019, sem alcançar o título máximo; desde então, conquistou três títulos em quatro temporadas, o que permitiu à equipe competir nas fases eliminatórias da UEFA.

O estádio Djúpumýra, onde o KÍ joga suas partidas nas competições nacionais, tem capacidade para 2 mil torcedores, aproximadamente 40% da população de Klaksvík. Durante as eliminatórias europeias, devido ao não cumprimento dos requisitos mínimos da UEFA, o clube realiza seus jogos como mandante no Tórsvøllur, o estádio nacional das Ilhas Faroe. Nesta temporada, o KÍ lidera o campeonato local, com cinco pontos de vantagem sobre o segundo colocado, e esse sucesso também se reflete no cenário europeu.

Apresentando um elenco jovem, com uma média de idade de 25 anos, o time está escrevendo a maior história da temporada até o momento. Dos 31 atletas no elenco, 20 são originários do arquipélago, enquanto os outros 11 vêm da Noruega, Dinamarca, Suécia e Sérvia – sendo este último o único país fora da região nórdica com representantes no elenco.

A narrativa do KÍ tem semelhanças com a trajetória da Islândia na Eurocopa de 2016 e na Copa do Mundo de 2018. Assim como a seleção, o clube inclui atletas que não dependem exclusivamente do esporte para sustento. Eletricistas, vendedores e, sobretudo, trabalhadores da indústria pesqueira fazem parte do grupo, sob o comando do treinador e ex-meio-campista norueguês Magne Hoseth.

Estádio do KÍ Klaksvik tem capacidade para 2 mil torcedores e não pode receber partidas internacionais. Foto: Divulgação/KI Klaksvik

Aos 42 anos, ele lidera a equipe principal desde 2022. Destacado como a “mente por trás”, de acordo com o perfil oficial do clube, ele já conquistou um campeonato nacional com a equipe e desempenha um papel fundamental no sucesso desta temporada. Um exemplo disso é a história do goleiro titular da equipe: Jonathan Johansson foi contratado este ano e assumiu a posição após lesões de seus colegas.

Apesar de sueco, Johansson se aposentou dos campos em 2021, mas retornou a uma liga amadora na Noruega. Lá, ele atuava como zagueiro, buscando principalmente a alegria de jogar futebol. Hoseth acreditou nele e o convidou para se juntar ao projeto do KÍ, que almejava competir em torneios europeus. Johansson compartilhou em uma entrevista ao portal Nettavisen, da Noruega, que embora não tivesse defendido as traves por dois anos, Hoseth confiou que sua habilidade era suficiente. O goleiro renovou seu contrato com o clube até dezembro de 2023 nesta semana.

Além do goleiro, Árni Frederiksberg é o destaque da campanha do KÍ nas eliminatórias. Ele marcou em todos os confrontos da Liga dos Campeões, totalizando seis gols em seis jogos. Até agora, ele só não marcou na partida de ida contra o Sheriff, pela Europa League.

Elenco do KÍ tem jogadores da Suécia, Noruega, Sérvia e Dinamarca. Foto: Divulgação/KI Klaksvik

Com 31 anos, o meio-campista também enfrenta a realidade do futebol semiprofissional, tal como seus colegas. Durante o dia, ele atua como representante de vendas, reservando as noites para treinar com o KÍ entre 17h e 20h, no horário local. Isso permite que o jogador, que já defendeu a seleção nacional, complemente sua renda.

‘BRASILEIRO NAS ILHAS FAROE’

Assim como em muitas outras partes do mundo, o KÍ também conta com um toque brasileiro em seu elenco. Entre os jogadores dinamarqueses, há um nome que chama a atenção do público à primeira vista: Patrick da Silva, um lateral de 28 anos, recebeu seu nome devido à sua mãe brasileira, embora tenha nascido na Dinamarca.

Patrick compartilhou com o Estadão que não fala português porque não teve contato com a cultura brasileira. “Vim para a Dinamarca muito jovem e não tive a oportunidade de aprender o idioma da minha mãe.” Sua mãe é natural do Recife, em Pernambuco. Patrick marcou o gol de empate do KÍ contra o Sheriff na partida de ida da fase eliminatória da Europa League.

O jogador encontrou nas Ilhas Faroe uma oportunidade de recomeçar sua carreira. Em 2021, ele foi condenado na Dinamarca por enviar mensagens íntimas a uma jovem de 14 anos. Ficou sob liberdade condicional por 20 dias e teve que pagar uma multa pelo crime.